Coelho, Ana Isabel Cavaco Pinto. "The dispersal of native and introduced seeds by São Tomé forest birds." Master's thesis, 2016. http://hdl.handle.net/10451/27357.
Streszczenie:
Tese de mestrado, Biologia da Conservação, Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências, 2016<br>Com a população mundial a aumentar, os impactos antropogénicos nos ecossistemas naturais vão sendo cada vez mais evidentes. Assistimos actualmente a uma elevada taxa de extinção de espécies, e com elas se perdem as funções e os serviços ecossistémicos que prestam, deixando os ecossistemas mais vulneráveis às pressões humanas. Uma dessas funções, essencial à manutenção da dinâmica florestal, é a dispersão de sementes, que nos trópicos é feita essencialmente através de relações mutualistas entre plantas e animais. A eficácia da dispersão pode variar substancialmente em função da espécie dispersora e depende não só da quantidade de sementes que os animais transportam, mas também da qualidade do tratamento que estes proporcionam às sementes. A perda de um dispersor chave num ecossistema pode portanto comprometer a viabilidade das populações de plantas e alterar a dinâmica da vegetação. Os efeitos da perda da biodiversidade são particularmente graves nas ilhas, onde se concentra grande parte das espécies, sobretudo endémicas. Aqui, as espécies evoluíram em isolamento, existindo naturalmente uma menor diversidade de espécies e possivelmente uma menor redundância funcional entre espécies. Estas características fazem com que estes ecossistemas sejam mais frágeis, e é nas ilhas que se tem verificado a maioria das extinções de espécies. Uma das principais ameaças identificadas é a introdução de espécies invasoras, que competem com as espécies nativas, acabando por as excluír. São Tomé é uma pequena ilha oceânica de clima tropical, situada no sistema insular do Golfo da Guiné. Com uma das maiores concentrações de endemismos de todo o mundo, São Tomé está a sofrer as consequências dos impactos humanos, estando a sua biodiversidade bastante ameaçada. Este trabalho tem então como objectivo perceber de que forma as aves estão a contribuir para a dispersão de sementes, uma função ecossistémica essencial para as florestas ricas em endemismos de São Tomé. Para tal, foram definidos três objectivos específicos: (1) avaliar a rede de dispersão de sementes por aves do sub-bosque em floresta de montanha, através da análise dos excrementos de aves capturadas com redes verticais; (2) avaliar a contribuição específica dos pombos como potenciais dispersores de sementes em São Tomé, através da análise de conteúdos de papos de pombos caçados; (3) caracterizar a dispersão de sementes na floresta de montanha, unindo os dados provenientes dos pontos anteriores, ponderados com a abundância relativa das aves. As redes de dispersão de sementes foram construídas analisando as matrizes de interação com o ‘package’ bipartite do programa R. A frequência de interação foi quantificada como o número de excrementos ou papos de cada espécie de ave contendo pelo menos uma semente intacta de cada espécie de planta. Foram capturadas 15 espécies de aves com redes verticais no sub-bosque em floresta de montanha, todas elas endémicas. Confirmámos dispersão de sementes por seis destas espécies, de destacar a contribuição do Olho-grosso (Speirops lugubris), responsável por 88% da frequência de interação. As espécies de plantas nativas dominam esta rede (14 espécies, 70% das espécies identificadas), incluindo algumas espécies endémicas ameaçadas, enquanto que poucas são as espécies introduzidas incorporadas na rede de dispersão (seis espécies, 20% das espécies identificadas). Através de curvas de acumulação de espécies, é possível afirmar que o esforço de captura foi bastante elevado, tendo-se conseguido capturar 71% das espécies de aves que ocorrem na área de estudo e 65% das plantas a serem dispersas. A comparação entre as redes de dispersão de sementes da floresta primária (obô) e da floresta secundária (capoeira) revelou poucas diferenças, o que pode estar relacionado com a proximidade geográfica das áreas de amostragem. Estes resultados sugerem ainda que os dispersores se movem entre os dois tipos de floresta, contribuindo para a disseminação das sementes entre habitats, o que vai facilitar tanto a invasão por espécies introduzidas, como a regeneração de espécies nativas em zonas de floresta degradada. A análise da rede de dispersão de sementes por pombos em São Tomé permitiu verificar a importância das três espécies endémicas caçadas como potenciais dispersores de sementes. Em especial a Rola (Columba malherbii) e o Cécia (Treron sanctithomae), tanto por serem as mais abundantes, como por serem as que mais frequentemente continham sementes no papo. Esta rede é dominada por sementes nativas (53 % da frequência de ocorrência) e apenas uma pequena percentagem de introduzidas (21% da frequência de ocorrência), sendo que uma destas (Cecropia peltata) está incluída na lista das 100 piores espécies invasoras do mundo. Já o Pombo-do-mato (Columba thomensis) é uma espécie mais rara, tendo a sua população vindo a decrescer maioritariamente devido à pressão de caça. É necessária alguma cautela ao analisar estes resultados, uma vez que as sementes nos papos dos pombos teriam ainda de passar por todo o processo de digestão, podendo levar à sua destruição antes de serem depositadas. No entanto, mesmo que poucas sementes resistam à passagem pelo trato digestivo da ave, a probabilidade destas serem dispersas a longa distância é elevada, dada a grande capacidade de voo dos pombos quando comparada com as das restantes aves existentes na ilha. A dispersão de sementes nas florestas de montanha de São Tomé é suportada exclusivamente por aves endémicas, um resultado surpreendente mesmo no contexto de ilhas oceânicas. A grande importância do Olho-grosso como dispersor de sementes resulta não só da frequência com que as dispersa, mas também da sua elevada abundância nestas florestas. Apesar do método utilizado ser dirigido a aves do sub-bosque, foi possível capturar também alguns indivíduos de espécies mais associadas à copa das árvores, como o Neto-de-olho-grosso (Zosterops feae). Foi também possível comprovar que o Pardal (Serinus rufobrunneus) é sobretudo um predador de sementes, já que apenas uma reduzida proporção dos dejectos continha sementes intactas. Os pombos parecem ser quantitativamente pouco relevantes, sobretudo devido à sua abundância reduzida, mas podem constituir importantes dispersores a longa distância e de sementes de maiores dimensões. Foi ainda detetada alguma complementariedade entre os vários dispersores, já que apenas o Tordo (Turdus olivaceofuscus) e o Papafigos (Oriolus crassirostris) foram encontrados a dispersar as sementes maiores (8-10mm). Estes dois dispersores, de maiores dimensões, possuem uma garganta mais larga que lhes permite engolir sementes maiores. A elevada ‘species strength’ destes dispersores reflete isso mesmo: uma grande dependência deles por parte das plantas com sementes maiores, já que estas aves são as únicas capazes de dispersar as suas sementes. O Tchin-tchin-txoló (Ploceus sanctithomae), a Camussela (Ploceus grandis) e o Pastro (Onycognathus fulgidus) já foram observados a consumir frutos e sementes, mas permanecem indicados apenas como potenciais dispersores, pois não foi possível comprovar que desempenhem esta função. Dos nove dispersores de sementes encontrados neste estudo, seis estão ameaçados de extinção, segundo os critérios da IUCN. Este é um facto preocupante, uma vez que a extinção de qualquer um destes dispersores irá ter um impacto negativo na dispersão de sementes, com consequências desconhecidas para a estabilidade do ecossistema. Apesar da importância da dispersão de sementes para a dinâmica florestal, muito pouco se sabe sobre esta função do ecossistema em São Tomé. Este é um trabalho pioneiro nesta área, na medida em que foram dados os primeiros passos para compreender como funciona esta importante função do ecossistema nesta ilha. No entanto ainda há muito por perceber. É preciso uniformizar a metodologia de amostragem e aplicá-la a todos os dispersores e também potenciais dispersores, estendendo a amostragem no espaço e no tempo. É ainda necessário compreender a qualidade do tratamento que cada dispersor dá a cada espécie de planta, inibindo ou aumentando a sua taxa e velocidade de germinação. Para além das aves, focadas neste trabalho, outros grupos de animais terão certamente um papel relevante na dispersão de sementes, nomeadamente os invertebrados, os morcegos frugívoros e alguns dos mamíferos introduzidos, como a Lagaia (Civettictis civetta) e o Macaco (Cercopithecus mona). É também necessário avaliar até que ponto as espécies de plantas introduzidas se comportam como invasoras e de que forma competem com as nativas, diminuindo as suas probabilidades de recrutamento. Finalmente, o transporte das sementes, mesmo que viáveis, não se traduz necessariamente no recrutamento de novos indivíduos: a qualidade do local de deposição é um factor crucial no contributo das aves para a dinâmica populacional dessa planta, e no conjunto, para a dinâmica florestal. Em resumo, esta tese fornece a primeira caracterização da rede de dispersão de sementes de São Tomé, abrindo as portas para um conhecimento mais detalhado e abrangente das interacções biológicas que sustêm as comunidades biológicas nestes ecossistemas.<br>The island of São Tomé, in the Gulf of Guinea, is a biodiversity hotspot with a remarkable number of endemic species and unique forest ecosystems. Much of its biodiversity is currently threatened by the increasing human population and associated habitat change, which is simultaneously threatening ecosystem functions and services. Seed dispersal is one of such key ecosystem services, essential for forest regeneration. The goal of this work is to understand how forest birds are contributing to the dispersal of both native and introduced seeds in São Tomé, providing the first community-level assessment of species interactions in maintaining ecosystem functions in the island. We collected droppings from mist netted birds and analysed the crop contents of hunted pigeons. All 18 sampled bird species were endemic and nine of them were dispersing seeds. The São Tomé Speirops played a central role as seed disperser. The seed dispersal network is dominated by native plant species, with only a few introduced species being dispersed in the forest. We corrected the frequency of occurrence of seeds in the droppings with independent estimates of bird abundance, and showed that this correction is key to understand disperser contribution to the overall network. Birds are therefore playing a double role, facilitating the dispersal of introduced species but also spreading the native flora. These results highlight a difficult conservation dilemma, since birds might be simultaneously contributing to forest regeneration and to biological invasion.