Lemos, Gil Ramos Lopes Gonçalves. "Wave climate in a global warming scenario: simulations with a CMIP5 ensemble." Master's thesis, 2016. http://hdl.handle.net/10451/24664.
Abstract:
Tese de mestrado em Ciências Geofísicas, apresentada à Universidade de Lisboa, através da Faculdade de Ciências, 2016<br>As ondas gravíticas geradas pelo vento na superfície do oceano são as mais energéticas do espectro, sendo responsáveis por mais de metade da energia presente em todas as ondas nesta superfície (Kinsman, 1965). São geradas pela transferência de momento do vento para a água e dominam o espectro de ondas oceânicas, ultrapassando a contribuição das marés, das “storm surges”, dos tsunamis, etc. (Munk, 1951). Pela sua prevalência no oceano e influência nas actividades humanas, o seu estudo deve ser aprofundado, e as potenciais alterações no seu regime devem ser tidas em conta. Porém, apesar da sua relevância, não existe ainda nenhum modelo teórico preciso de geração e crescimento das ondas, dado que os mecanismos presentes nestes fenómenos não são ainda totalmente compreendidos por forma a serem correctamente quantificados.
Quando o vento sopra sobre a superfície do oceano, ondas são formadas pela transferência de momento no sentido da água. Esta perturbação inicial pode desenvolver-se se o vento continuar a soprar de forma constante, sendo que as ondas irão crescer até atingirem o seu nível de saturação. Os dois principais tipos de ondas à superfície do oceano são denominados “wind sea” ou apenas “sea”, e “swell”. As ondas de “sea” detêm alta frequência e curtos comprimentos de onda, estando directamente associadas ao campo de vento sobrejacente, crescendo rapidamente e depressa atingindo o nível de saturação. Por sua vez, as ondas de “swell”, com frequências mais baixas e comprimentos de onda maiores, crescem lentamente e podem propagar-se com velocidades de fase superiores à velocidade do vento, uma vez que também extraem energia de ondas com mais alta frequência, devido a interações não lineares entre as ondas. Estas ondas podem propagar-se por milhares de quilómetros (Barber and Ursell, 1948; Munk et al., 1963; Snodgrass et al., 1966) com muito ligeira atenuação (Ardhuin et al., 2009). Assim sendo, é possível assumir que existe uma ligação causal entre, por exemplo, um evento local de erosão costeira e uma tempestade que ocorreu “do outro lado” do mundo (em outro hemisfério). Este é apenas um dos factores interessantes que motivam a execução deste trabalho de análise das futuras alterações no clima de ondas global, uma vez que as alterações climáticas atmosféricas locais no vento podem propagar-se sob a forma de ondas à superfície do oceano, e gerar impactos a longas distâncias.
Até recentemente, o impacto das alterações climáticas no clima de ondas futuro tinha recebido muito pouca atenção. Nos últimos anos, alguns estudos foram realizados, sob os auspícios do COWCLIP (Coordinated Ocean Wave Climate Project), utilizando um único modelo e um único cenário de concentração de gases de efeito estufa (CMIP3), recebendo atenção moderada por parte do IPCC-AR5 (Intergovernmental Panel for Climate Change - Fifth Assessment Report). No presente estudo, o impacto do aquecimento global no clima de ondas global é investigado, através de um “ensemble” composto por 2 membros (simulações do modelo de ondas WAM) de um conjunto maior, composto por 8 simulações dinâmicas e 20 simulações estatísticas, denominado GLOWAVES-2, e pertencente ao projecto COWCLIP. O (único) forçamento destas duas simulações (em termos de velocidade do vento e cobertura oceânica de gelo) provém do modelo climático EC-Earth, seguindo um cenário de elevadas emissões de gases de efeito estufa (RCP8.5). Ambas as simulações cobrem um período total de 130 anos (1971-2100), no entanto, para efeitos de análise comparativa, dois períodos mais curtos são utilizados como referência: o “clima presente” (PC20: média das duas simulações (PC20-1 e PC20-4); 1971-2000) e o “clima futuro” (projectado; FC21: média das duas simulações (FC21-1 e FC21-4); 2071-2100). O período de referência histórico (1971-2005) foi validado através da comparação com a reanálise ERA-Interim, do ECMWF (European Centre for Medium-Range Weather Forecasts) e com dados observacionais de bóias, revelando que o modelo WAM, com forçamento do EC-Earth, é capaz de produzir cenários realistas do clima de ondas global no final do século XX, fornecendo a confiança necessária na capacidade de simular uma alteração climática igualmente credível até ao final do século XXI. Os resultados (alterações futuras no clima de ondas como projectado pelas simulações) são obtidos através da comparação entre as médias de PC20 e FC21, para quatro variáveis diferentes: (altura significativa; m), (período médio da onda; s), (direcção média da frente de onda; º), (potência das ondas; W/m, = , como em Young, 1999). Para complementar os resultados destas variáveis, os impactos da alteração climática no campo do vento ( ; velocidade do vento a 10 metros de altura; m/s) foram também analisados. Os resultados expõem médias a nível anual e sazonal (estações extremas de Inverno e Verão: DJF (Dezembro, Janeiro e Fevereiro) e JJA (Junho, Julho e Agosto)). Como forma de complemento, são também apresentadas as tendências lineares ao longo do período 2006-2100, para a altura significativa e para a potência (fluxo de energia) das ondas.
Devido às alterações climáticas, as projecções indicam alterações estatisticamente significativas em todas as variáveis analisadas, que poderão referir-se a aumentos ou decréscimos na sua intensidade, gradiente espacial ou mudanças na localização geográfica de determinados valores. No que toca à altura significativa, , os aumentos nesta variável dominam as projecções, essencialmente a nível anual, e durante o período JJA (verificando-se em 73.93% do oceano global), sendo no Oceano Antárctico (“Southern Ocean”) que os maiores aumentos se verificam, estando esta situação directamente relacionada com uma intensificação projectada a nível da velocidade do vento ( ) na mesma área. A região onde os decréscimos projectados se mostram mais prevalecentes é no Oceano Atlântico Norte, em particular durante DJF. A tendência linear de altura significativa projectada durante o período 2006-2100 estabelece-se, a nível anual, em 0.41 cm/década.
No que toca ao período médio, , são esperados aumentos nos seus valores anuais e sazonais em praticamente todo o oceano global, excepto no Atlântico Norte e Pacífico Oeste durante DJF, e em maior extensão no verão boreal (JJA), em 87.48% da área de oceano global, em média. Tendo em conta os resultados para esta variável e para a altura significativa, uma vez que a potência das ondas ( ) depende destes, é esperado que o seu comportamento não se diferencie muito dos anteriormente referidos. É efectivamente o que acontece nas projecções de , onde se verifica um padrão de alterações muito semelhante ao da altura significativa, uma vez que as diferenças de apresentam valores reduzidos. Aumentos projectados de potência das ondas (que se observam em 81.43% do oceano global) alcançam os 30% no sector Índico do Oceano Antárctico (a sudoeste da Austrália), durante o inverno austral (JJA), sendo que o valor médio de incremento a nível global para esta estação se situa nos 7.18%. A tendência linear de potência das ondas projectada durante o período 2006-2100 estabelece-se, a nível anual, em 0.36 cm/década.
Relativamente à direcção média da frente de onda ( ), as projecções indicam a prevalência de rotações anti-horárias (contra os ponteiros do relógio) nas latitudes médias e altas de ambos os hemisférios, associadas ao deslocamento latitudinal positivo das tempestades para latitudes mais elevadas (Arblaster et al., 2011). Nas regiões tropicais e subtropicais, rotações positivas (no sentido dos ponteiros do relógio) são consistentes com uma maior contribuição de “swell” proveniente do Oceano Antárctico, especialmente durante o inverno austral (JJA), quando a sua “produção” é maior.
A análise de EOFs (“Empirical Orthogonal Functions”) para os campos de e no Oceano Atlântico Norte, em termos de alterações entre o clima presente (PC20) e o projectado para o futuro (FC21), relevou que é esperado um ligeiro enfraquecimento dos principais centros de acção de ambos os campos (redução da variabilidade), a nível anual. A nível sazonal, comportamento similar foi detectado para a altura significativa, porém, a nível de potência, um ligeiro fortalecimento dos seus centros de acção é esperado, com um deslocamento latitudinal positivo associado, de cerca de 2º. No entanto, deslocamentos da posição dos valores climatológicos máximos para latitudes mais elevadas não se verificam para o Atlântico Norte, apenas em algumas regiões do Oceano Antárctico.<br>Ocean surface wind waves are of outmost relevance for practical and scientific reasons. On the one hand, waves have a direct impact in coastal erosion, but also in sediment transport and beach nourishment, in ship routing and ship design, as well as in coastal and offshore infrastructures, just to mention the most relevant. On the other hand waves are part of the climate system, and modulate most of the exchanges that take place at the atmosphere-ocean interface. In fact waves are the “ultimate” air-sea interaction process, clearly visible and noticeable. Up until recently, the impact of climate change in future wave climate had received very little attention. Some single model single scenario global wave climate projections, based on CMIP3 scenarios, were pursued and received some attention in the IPCC (Intergovernmental Panel for Climate Change) AR5 (Fifth Assessment Report). In the present study the impact of a warmer climate in the global ocean future wave climate is investigated through a 2-member “coherent” ensemble of wave climate projections: single-model, single-forcing, and single-scenario. The two ensemble members were produced with the wave model WAM, forced with wind speed and ice coverage from EC-Earth projections, following the representative concentration pathway with a high emissions scenario 8.5 (RCP8.5). The ensemble historic period has been set for 1971 to 2005. The projected changes in the global ocean wave climate are analyzed for the 2071-2100 period. The ensemble historical period is evaluated trough the comparison with the European Centre for medium-range weather forecasts (ECMWF) ERA-Interim reanalysis, and buoy observations.